Artigo
Sentimentos postais
jornal Turma da Barra

 


Fergnan Silva

'A carta possui um caráter de eternidade, e implica que alguém sentiu uma necessidade de compartilhar
a mesma alegria e perpetuá-la
'

*Frei Fergnan Silva

            Hoje me sentia tão comum como em "qualquer" outro dia. Não sei bem se o dia era quinta ou sexta; tudo bem não fazia mal, no fim das contas não iria mudar muita coisa mesmo... Iria me acordar no mesmo horário, fazer aquilo já pré- estabelecido e pensado. Enfim, tudo o que me tornaria comum fazendo coisas comuns.
            Mas de repente no meio do meu dia alguém me entregou uma carta e disse- me: "Mandaram pra você". Talvez para muitos isso não influenciaria em nada a rotina, aliás talvez até atrapalharia a "programação". Porém para mim, essa expressão fez toda a diferença: MANDARAM PRA VOCÊ! Pois tornou- me um pouco mais feliz. Escrevemos cartas para dizer a alguém que ela é muito importante e que nos faz felizes até pelo simples fato de pensarmos nela.
            É claro que hoje em dia isso pode ser dito de várias maneiras e até de forma mais eficaz, como por exemplo, através do telefone ou da internet. Concordo plenamente. Contudo ainda sim para mim, ela possui toda uma atmosfera de poesia que os outros meios não possuem. O sentimento é muito banalizado e as palavras ditas se vão com o vento e o tempo. A carta possui um caráter de eternidade, e implica que alguém sentiu uma necessidade de compartilhar a mesma alegria e perpetuá-la.
            E aonde eu guardei tamanho tesouro? não sei, está lá perdido entre os meus papéis. Mas antes que você se irrite e pense que estou brincando com seus sentimentos tenho que dizer que foi de forma proposital: eu com certeza irei esquecê-la, e a vida voltará a ser comum. Qualquer dia desses, estarei atarefado a procura de alguns papéis que não me dizem muita coisa e então, por "coincidência" irei encontrá-la, parar e lembrar da nossa amizade. E como um passe de mágica, aquele dia não será mais tão comum, nem eu serei mais tão comum, pois essa coincidência me trará naquele momento um pouco mais de felicidade e a certeza de ser especial para alguém.


*Fergnan Silva, 22 anos, barra-cordense, estuda filosofia no Seminário dos Frades Capuchinhos em São Luís (MA)

(TB28out2015)

Artigo
Sinos de Barra do Corda
Não deixem de tocar
jornal Turma da Barra

 

'Sinos de Barra do Corda, faço um pedido: NÃO DEIXEM DE TOCAR! Não simplesmente melodias, mas os corações de todos aqueles que viveram parte de sua vida aqui, e que apesar de tudo não vos esquecem!'

*Frei Fergnan Silva

            Já é por volta de seis horas da tarde, me encontro sentado em um banco da praça, de frente para a Igreja Matriz, o sol já vai se pondo, mas ainda permite que seus últimos raios reflitam sobre os mosaicos que enfeitam sua fachada. Tudo respira poesia: o tempo, as plantas, os pássaros, tudo, exceto as próprias pessoas, que muitas vezes não se deixam perceber.
            De repente, os sinos da torre dão o seu primeiro badalar, e todas as pessoas que estavam muito ocupadas, por um instante fixam o seu olhar no carrilhão, que a essa altura está com os seus sinos a bater em perfeita harmonia.
            Me ponho a questionar porque tamanha reação: passou pela cabeça, as horas, todavia não vi fundamento, até porque hoje em dia todo mundo tem relógio: seja no pulso, no bolso, no celular etc ; além do mais, o relógio da torre volta e meia se atrasa devido ao seu mecanismo ser velho. Esta primeira hipótese é descartada!
            Pensei logo após na melodia e na consonância dos sinos, que por sinal são muito belos, aliás em todas essas minhas pequenas andanças, são poucos os carrilhões que possuem uma beleza igual a esta.
            Percebi então que estava certo, mas não somente por isto, mas pelas lembranças que surgem automaticamente com o seu toque: todos ainda estavam olhando em direção aos sinos, mas percebi que seus olhares vislumbravam muito mais longe, mais além: lembravam de pessoas, lugares, histórias, que talvez nem fossem tão agradáveis, mas que não deixavam de ter importância, afinal de contas é isso que conta.
            Percebi então que os sinos tocavam melodias e corações, e como fruto de tudo isso, poesias, que nunca estiveram mortas, mas somente adormecidas.
            Sinos de Barra do Corda, faço um pedido: NÃO DEIXEM DE TOCAR! Não simplesmente melodias, mas os corações de todos aqueles que viveram parte de sua vida aqui, e que apesar de tudo não vos esquecem! Eu, da minha parte, prometo que sempre quando puder, virei aqui para vos escutar com o mesmo estupor com que vos escutava na minha infância. Essa promessa não tenho medo de falhar, até porque se me esquecer, no seu primeiro badalar hei de lembrar!

*Fergnan Silva, 22 anos, barra-cordense, estuda filosofia no Seminário dos Frades Capuchinhos em São Luís (MA)


(TB19ago2015)