História
Igreja Matriz faz 60 anos
jornal Turma da Barra

Os presidentes Eurico Arruda 
(da Academia Barra-Cordense de Letras),
e Cezar Braga (da Arcádia Barra-Cordense)
escreveram inspiradas crônicas sobre a igreja Matriz.
O primeiro artigo foi publicado pelo jornal O Passaro (já extinto).
O segundo pelo jornal Turma da Barra

 


Igreja Matriz
no início da década de 60


Os sinos da Matriz

*Eurico Arruda


            Faz pouco mais de meio século que o saudoso Frei Adriano presenteou à Barra do Corda, o carrilhão que está encimado no campanário da Igreja Matriz.
            Recordo-me ainda, quando chegaram os batelões, que os trazia, rebocados, salvo engano, pela lancha “Rio Corda”, pertencente ao Sr. Mundiquinho Guimarães.
            Lembro-me do sacrifício era retirá-los dos porões dos batelões, atracados na velha Rampa. Toda a cidade se movimentou para olhar a retirada dos sinos. Homens, carroças, guinchos, e até mesmo junta-de-bois, se confundiam na operação comandada por Frei Adriano, que, suado e cansado, dava ordens.
            Foi quando apareceu o primeiro colosso de bronze. E o povo, comprimido, espichava o pescoço para ver melhor; outros ficavam na ponta dos pés, em posição ereta; outros subiam nas cercas e calçadas das casas vizinhas, e as árvores perto foram disputadas por moleques que se insultavam e trocavam impropérios.
            Eu me encontrava nos braços de minha mãe, que num grande esforço, me levantou bem alto, e pude ver o primeiro sino que aparecia.
            Depois houve uma exposição na velha Matriz, que ficava no centro da praça Melo Uchoa, uma verdadeira jóia de arquitetura colonial em que se misturavam em alguns traços, o estilo gótico, ao gosto da arquitetura manoelina.
            Pois bem, em frente ao altar do Coração de Jesús, da velha Igreja, estavam os sinos em exposição. Eram cinco ao todo e tinham figuras em alto relevo delicadamente encravadas nas bordas. Aquelas figuras que me pareciam santos, me impressionaram muito e criaram umas idéias fantásticas na minha inspiração de criança. Ficava horas inteiras olhando o funcionamento do mecanismo do relógio, ligado aos badalos dos sinos maiores, um deles, o maior, apelidado de Frei Francisco, quando martelava com precisão as horas.
            Foram fundidos na Itália, em bronze de alta qualidade, por um dos maiores artistas do mundo, do qual não me recordo do nome no momento (Giovino Castiglione). Passara a 2ª Guerra Mundial camuflada num subterrâneo. A sua liberação pelo governo Italiano de após guerra, envolveu desde pequenos, médios e grandes expediente burocráticos e até contatos diplomáticos.
            Finalmente, estão na Barra do Corda, após uma verdadeira epopéia burocrática e luta de um homem de fé que se chama Frei Adriano.
            Hoje, muitos de nós barra-cordenses, não sabemos dar a esta preciosidade que aqui se encontra, o seu verdadeiro valor. O seu valor é tão grande, que não precisa se pagar para ouvi-lo. Quem quiser aquilatar o som dos nossos sinos, que ouça os sinos das milhares de igrejas e campanários existentes por estes brasis afora.
            Quando você tiver habituado a ouvi-los, passe alguns dias fora, em outra cidade, e quando voltar, ouça-os às seis horas da tarde, quando a cigarra tiver se despedindo do dia que passou e aplaudindo a noite que vem, e sinta a paz e o som inaudito dos nossos sinos, que se transforma numa verdadeira ORAÇÃO.

*Eurico Arruda é presidente da Academia Barra-Cordense de Letras

(Artigo originalmente publicado pelo jornal “O Pássaro, em 10 de novembro de 1979)

 

 

A torre da igreja da minha cidade

*Cezar Braga

            A maioria das cidades pequenas do Brasil tem, quase sempre, a igreja como sua construção mais arrojada, mais imponente.
            A igreja da minha cidade é majestosa. Projetada por frei Adriano, teve sua construção iniciada por seus sucessores em 1951. Já que um ano antes o insigne frei, desgostoso com a luta mantida com facções políticas locais, que se opunham a demolição do Paço Municipal e a Igreja Matriz (construída em 1893), abandonou a cidade.
            Após a demolição das obras citadas a construção da nova igreja foi iniciada e mesmo ser estar concluída o bispo da Diocese, Dom Emiliano, a benzeu, ainda em 1951, conforme notas do historiador Galeno Edgar Brandes.
            A torre da igreja da minha cidade é pomposa, soberba e de uma ubiqüidade impressionante. É vislumbrada por quase todos os cantos da minha cidade e ela – silenciosa, altiva e imponente – vislumbra a própria cidade, as casas, os fiéis, os infiéis, contempla as pessoas e suas matizes, os devotos e sua devoção, os amigos e sua amizade, os dignos e os indignos com sua dignidade e indignidade, a hipocrisia dos hipócritas, a devoção dos amantes, o desamor dos sem-alma, o descaso dos bêbado
s que por ela passam sem nota-la, ouve os murmúrios, lamentações e quem sabe até o pedido de perdão dos presos que lhe são vizinhos. Pois a cadeia lhe faz limite.
            E é ali, aos pés da torre da igreja da minha cidade, que a religiosidade do nosso povo se manifestam, juntamente com as manifestações profanas.
            A torre da igreja da minha cidade também abriga os sinos que anunciam a hora da missa, a hora de ter esperanças, anunciam, também, com seu toque triste, o falecimento de alguém. A população acerta seus relógios com o seu relógio.
            O sol quando surge, a primeira coisa que faz é beijar a torre da igreja da minha cidade, para depois descer lentamente seus raios até atingir as ruas e as casas e acarinha com seu calor o povo da minha cidade. O sol às vezes espera a lua aparecer e com ela divide o mesmo céu. E de lá sorriem, homenageando a torre da igreja da minha cidade, que com altivez agradece e fica lisonjeada.
            A torre da igreja da minha cidade lobriga, onisciente, os homens simples, dignos e comuns e também os indignos. Ela contempla também e com carinho, os que vieram de fora para ficar por opção, e os que nasceram aqui e não podem ficar, pois são obrigados a saírem para tentar melhorar de vida, por falta de perspectivas aqui...
            A torre da igreja da minha cidade abriga além dos símbolos óbvios do cristianismo, uma galeria com as fotos dos mártires da hecatombe do Alto Alegre, que lá do alto derramam bênçãos e proteção ao povo deste lugar. É dela a fulguração de onde as tristezas e alegrias, esperanças e desesperanças se espalham por minha cidade.
            Minha cidade é Barra do Corda.

*Cezar Braga é presidente da Arcádia Literária

(Artigo originalmente publicado pelo jornal “Turma da Barra", em 23 janeiro de 2004)


Igreja Matriz atual


Igreja MatrizC

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(TB4dez2011)